
Sozinha no quarto, numa dessas aconchegantes noites geladas de Curitiba, ela tem um sobressalto. Precisa ver gente. Sente uma necessidade louca de contato humano. Pensa em sair.
- Mas já é tarde! Tá frio à beça!
- Deixa de ser boba, vai ficar morgando em casa por quê?
- Morgando, ora essa! Até parece.
- Morgando sim senhora! Parece uma tiazona encalhada, toda entrouxada dentro da casca. Com medo da vida.
- Ah! Me deixa. Eu tô bem assim.
- Está bem assim, uma ova. Eu que sei. Esquece queridinha quem é que passa as vinte e quatro horas do dia ouvindo a imensa ladainha de suas lamúrias?
- Lamúrias?
- Lamúrias, sim. E das mais irritantes.
- Tá bom. Mas ir pra onde? E fazer o que? Ninguém vai ser maluco o suficiente pra querer sair comigo nesse frio e a essa hora.
- Hum, sei não! Aposto que...
- Para! Não começa. Ele não...
- Ele não? Como assim, ele não?
- Ele não.
- Ah tá! Vai querer bancar a durona agora! Pra cima de mim. Ah! Vê se te enxerga criatura. Quem não te conhece que te compre. Pega logo este telefone e liga pra ele.
- Será?
- Lógico. Anda.
- Melhor não.
- Por que não?
- Ah! Sei lá.
- Deixa de frescura. Liga pro cara!
- Mas o que eu vou dizer? Não. Não vou ligar. Pronto. Tá decidido. Vou chamar uma pizza e ver um filme na TV.
- Liga pro cara!
- Ele vai achar que eu sou uma oferecida...
- Liga pro cara!
- E se ele...
- Liga logo pro cara!
Nisso, pela janela, vê um grande clarão seguido de um barulho aterrador. O forte trovão deixou a cidade às escuras.
Num impulso, passou a mão no telefone. Mudo. Sem sinal.
Tateia desesperadamente o quarto à procura do celular. Sem bateria.
- E agora?
- Agora, vira pro lado e vai dormir sua tonta! Arremata mordaz como um punhal, a voz impiedosa da sua consciência.
Por André Luís Fernandes Dutra – Em 08 de abril de 2010.
André,
ResponderExcluirFantástica sua crônica!
Joia
ResponderExcluirHahaha,que tonta,hein!
ResponderExcluirBoa jogada.