Blog dos participantes da Oficina Crônicas: entrevistas com o cotidiano do Setor de Literatura da Fundação Cultural de Curitiba - 2010.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Na interação das pessoas.


Na rua paro e avisto uma mulher a avistar uma árvore. Não só por causa disso, pois o sinal acaba de abrir. para os carros. Mas continuo por causa disso. Ela olha como se procurasse algo: era um ipê-amarelo. Avistava as flores interrogativamente, e eu procurando nela a resposta daquela procura. Não consigo achar algo que me satisfaça. O sinal fecha e eu sigo, então.

Uma leve brisa torna-se uma forte ventania, daquelas que levantam saias e entortam guarda-chuvas. Eu, sem um nem outro, continuo o caminho até a Praça Rui Barbosa. Na calçada, um jovem tenta sem sucesso arrumar os cabelos que, aos cachos, dançam a dança da chuva. O ruminar possíveis palavrões e xingamentos ao vento transforma-o num exemplar cômico, daqueles do tempo de Chaplin em seu cinema mudo. Passo por ele e nem me vê, sua ira aos ventos o cega. Por fim, a chuva cai. Estou com blusa impermeável e tênis fechado, nem ligo. Começa tímida, sem força: quase nem molha. Mas o desespero dos curitibanos é evidente; todos procuram por um toldo ou empunham suas sombrinhas, quase uma arma contra São Pedro. Mas há uma garota com uniforme de colégio que parece não sentir nem o vento nem a chuva. Absorta entre pensamentos, caminha displicente pela chuva que ganha força, engrossa. Noto que levanta o rosto para cima, como se quisesse enxergar quem enviou esse refresco natural. Fecha os olhos e deixa correr as gotas pelo rosto. Só pára o seu contentamento por que se aproxima de mim. Um pouco contida, olha para frente e continua como se não fizesse nada demais. E de fato nem é.

Chove, mas não em toda a cidade, pois vejo que o céu azul lá pras bandas do Estação ainda reina. Só uma nuvem passageira, pra lembrar que nada é definitivo nessa vida, nem mesmo o tempo. Porém sabemos que haverão sempre as quatro estações do ano em um único dia. Por aqui, São Pedro é bipolar, eu diria.

Na Rui Barbosa, ainda não há pombos, transeuntes dos céus curitibanos. Ainda. Só a chuva passar que eles voltam com força total. Dito e feito: a chuva passa. Alguns são tão petulantes que quase tiram a pipoca da mão das crianças . Ao ver o vôo rasante, identifico a arma sendo solta, vindo diretamente em mim, mas num passo para o lado , um senhor que vem atrás torna-se o alvo. Quase solto uma risada alta. E ele, com raiva, quase corre atrás do pombo, mas contêm-se em pegar seu lenço e passar no estrago feito. Olha-me com cara feia, talvez por ter deixado o campo livre para o ataque surpresa. O senhor é oriental; lembrei de Pearl Harbor na hora.

Sabe, passei a gostar mais dos dias chuvosos. Apesar de gostar do frescor da tarde ensolarada, a chuva nos faz prestar mais atenção na natureza ao redor. Fico perdido em pensamentos olhando as árvores e suas goteiras. Quando volto à realidade, noto que meu ônibus já está no ponto. Corro para não perdê-lo, senão só daqui uma hora.

Barba Ruiva

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