Blog dos participantes da Oficina Crônicas: entrevistas com o cotidiano do Setor de Literatura da Fundação Cultural de Curitiba - 2010.

terça-feira, 20 de abril de 2010

QUARENTA MINUTOS


Chego ao tubo 17:15h, saída da escola, tumulto, confusão, brincadeiras e etc. ...
Sobe e desce, fura tubo, empurra, empurra. Vem o expresso, meio no embalo todos entram e se separam.

Vou para a frente entre a porta 1 e 2, paro ao lado dos bancos preferenciais ocupados por duas mães com seus cinco filhos; mas o que chama atenção é o modo com que ocupam os bancos, uma no banco da frente com uma menina pequena deitada de bruços no banco ao lado e a outra no banco de trás tendo a seu lado uma juvenil, no banco que faz frente com a primeira mãe duas pequenas com não mais de cinco anos, sem contar o menino em outro banco na fila ao lado.

Peço para sentar no lugar da pequenininha, a “mãe” que estava ao lado me olha com um semblante de interrogação, mas pega a menina no colo e depois dá continuidade à conversa com a amiga.

- E aí, você vai ver a Su?
- Vou. Sabe onde desce?
- Sei, mas tá longe.
- Você vai entrar?
- Vou.
- Nossa! Esquecemos de trazer água mineral!
- Não dá nada, quando chegar lá eu compro.
- Será que tem onde comprar?
- Deve ter só que é o olho da cara.
- Sabe vou arrumar minha mala e deixar pronta.
- Que mala? A Nova?
- É aquela bem bonita.
- Eu falei pra Andréia que ela tava grávida.
- É eu sei, mas ela disse que não.
- Que nada, ela está passando mal direto, só não quer assumir.
- Ela está com o carinha?
- Acho que não, falei com a mãe dela e ela me garantiu que a Andréia não quer nem saber dele.
- É! Mas ela vai ver só daqui a nove meses.

Nesse momento ela passa a menina pequena por cima da cabeça para o banco de trás, olha para mim e diz que a mãe é a outra. Pega no colo o pequeno que havia saído do lugar e diz para mim que ele e a Milena (que está sentada de frente para nós) é que são seus filhos.
Rola de mão em mão uma maçã toda mordida, não se perde nada, pois não vi o cabinho e nem as sementes.
Passamos em frente à delegacia e em seguida ela – a que esta ao meu lado – recomeça.

- Você sabe que o Luizinho está preso?
- Não quero nem saber.
- Ele estava preso nesta delegacia. Como será que é?
- Não sei! Uma vez uma amiga me disse que parece um túnel, bem comprido e sem claridade alguma.
- Que ruim né!? Você veio visitar ele?
- Não, nem pensá!
- Há duvido, é só ele ser solto que ele vai aparecê na sua casa.
- Não quero nem pintado de ouro.
- Eu vou visitá ele. Ele tá aqui?
- Não, foi pra penitenciária.
- Mãe, mãe, este é um homem grávido?
- Não moleque, não existe grávido. Esta tira diz que este lugar é preferencial para pessoas idosas, gestantes (que nem a mãe), pessoas com criança de colo, deficientes e gordos há,há.
- Sabe, vou lá visitá ele só pra dizer que ele é um otário.
- É , mas daí ele vai ficar mais bravo do que já é.
- Escuta, você viu aquela mala nova que ganhei? Acho que vou por tudo dentro dela.
- Falta muito?
- Tá longe. Milena dê lugar pros outros.

A menina fica de pé na frente do banco, se aproxima de mim, que até então estava tentando ler o texto de Italo Calvino – Leveza, olha, me observa, vira de costas e sobe no banco de joelhos.
Enquanto isto o ônibus começa a lotar em cada tubo.

- Sabe acho que quero fazer magistério.
- E você vai ter tempo?
- Não sei não.
Separo uma cartela de adesivos para dar a Milena, mas como ela está de costas para mim entrego à sua mãe e me levanto para descer.
- Milena, olha o que a mulher te deu.
- Nossa que bonito! Gatinhos né mãe!
- Vou primeiro colocar no meu celular, diz a mãe.
- Deixa eu ver? Fala a companheira de banco de Milena.
- É, mas é meu.
- Próxima parada: Comendador Araújo.
- Desço.
- A porta será fechada ...

E o expresso segue em frente...
Malu

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